Enquanto terminava de passar o perfume e pentear o cabelo, dando um toque desajeitado, ela continuava assistindo a novela. Ela odiava cinema e tinha casado exatamente com um crítico da área. "Coisas do amor", repetiam os amigos para explicar aquilo.
Era insuportável pensar na possibilidade de assistir um documentário: americano, logo ela que adorava MPB; falando de 11 de setembro, ela que detestava fins trágicos, de um diretor gordo e chato, ela que só vivia de dieta.
Por isso demorava muito. E ele já estava irritado com aquela lentidão. "Quando é para ir nos shows de MPB, ela fica pronta duas horas antes", sentenciava ele enquanto ela vinha devagar para o banheiro, mas com os olhos na tevê tentando ver uma última cena.
Ele preferiu ir para sala e tentar se acalmar. Ela se aprontou e foram para o cinema. Chegaram em cima da hora e pegaram um lugar péssimo. "Tudo culpa dela. No próximo show que me chamar, ela vai ver", pensava ele. "Agora vou ter que assistir esse filme chato nessa primeira fila!", mais irritada pensava ela, enquanto começava a projeção.
As primeiras cenas vieram e toda a raiva dele foi passando e a dela foi dando lugar a um sono profundo. Ela dormiu! Ele nem viu. Ela adorou quando chegaram os créditos e ele logo se envolveu numa discussão sobre o filme com um colega do jornal que estava na saída. No fim, gostaram de tudo: ele de ter a campanhia dela e de assistir aquele filme tão esperado. Ela de ter descansado umpouco e ter acabado a projeção. Talvez seja por isso que estejam juntos até hoje.
Publicado em 17 de março de 2005
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