Lenny Kravitz
Ela era pura ansiedade. Finalmente ia ver o esperado show, do cantor que tinha todos os discos: Lenny Kravitz. Sabia todos os refrões, todas as letras, rimas e até tinha uma grande foto dele escondida atrás dos lençóis do armário, para que o marido não visse. Ele não fazia nenhuma questão daquele show, mas como ela tinha ido com ele no lançamento daquele filme cabeça dia atrás, não havia escapatória.
Sempre que tentava dizer que não ia ou pensava num discurso definitivo ou até mesmo grosseiro, vinham à mente as palavras de uma amiga dela: “Você é um marido exemplar. Vai até ao show com ela! Queria que seu marido fosse assim!” Pronto aquilo era suficiente para prosseguir naquele programa impossível.
E lá foram eles. Ela, entre as amigas, estava preparada para o show enquanto chuviscava. A multidão a porta, misturada com o cheiro de churrasquinho e pipoca, assustava. Ele ia andando como um animal para o abatedouro. E ela em puro entusiasmo. Veio o show de abertura, mas outro e nada do tal cantor pop aparecer.
Depois de muito barulho, Lenny entrou. A multidão ficou extasiada. Com certeza o marido não suportaria até o fim! Decidiu se enfiar entra as pessoas e procurar por uma cerveja ou até mesmo um copo de água. Explicou a intenção pra ela, ma não foi ouvido. Cantava um dos refrões que mais gostava. Entenderam-se com a linguagem dos sinais mesmo.
Comprou uma cerveja e foi tomando em goles curtos e demorados. Pegou no papo com um marido que também esperava pela esposa. “Incrível que existem outras pessoas como eu”, pensou com os botões. De repente descobriu uma legião deles, mulheres e homens que estavam ali apenas para acompanhar o parceiro, amigo ou quem quer que fosse.
Hora do bis, do mais uma. Começaram a dispersar e o celulares a tocar. “Estou debaixo da barraca vermelha”, “Mais à direita”, “À esquerda do palco”, “Estou te vendo aqui!”. E assim iam se encontrando. A despedida dos companheiros de espera era feita com adeus ou por olhares rápidos.
Finalmente, ouviu: “Amor, não foi maravilhoso! Te amo!”, disse ela, abraçando e dando um beijo longo, meio suado, mas carinhoso. Não dava para dizer mais nada. Demoraram quarenta minutos para sair do estádio e mais cinquenta para conseguir chegar ao carro e sair do engarrafamento.
Eles tomaram um banho quente quando chegaram em casa e dormiram abraçados, ainda com os cabelos molhados. E lá no subconciente ainda ecoava uma das letras do cantor da noite. “Temos que amar e facilitar as coisas”. Are you gonna go my way?
Publicado em 31 de março de 2005.
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